201210.08
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As Atribuições e os Limites da Atuação dos Auditores Fiscais do Trabalho

Por Ana Paula Didier Studart

A inspeção do trabalho tem por finalidade a prevenção e manutenção adequada dos direitos trabalhistas dos empregados, frente à relação trabalhista com o empregador, podendo ser pessoa de direito privado ou público. O objetivo principal é assistir o trabalhador, zelando pelo cumprimento da legislação trabalhista em prol do bem estar social.

Pode-se dizer que o Estado regula a relação trabalhista de duas formas: num primeiro plano a inspeção direta e autônoma do auditor-fiscal junto ao empregador e em segundo através da Justiça do Trabalho, provocada e dependente da vontade do empregado.

A inspeção tem como funções a manutenção do cumprimento dos direitos dos trabalhadores, que muitas vezes não têm ciência de grande parte deles, além da instrução ao empregador, para que este possa se ajustar aos termos da lei, principalmente com relação as mais novas e recém editadas.

A fundamentação legal da inspeção do trabalho é inicialmente encontrada na Constituição Federal de 1988, em seu art. 21, XXIV.

Além disso, a Consolidação das Leis do Trabalho em seu art. 626 e seguintes prevê a competência da regulamentação pelo Ministério do Trabalho, como se lê, in verbis:

Art. 626 – Incumbe às autoridades competentes do Ministério do Trabalho, Industria e Comercio, ou àquelas que exerçam funções delegadas, a fiscalização do fiel cumprimento das normas de proteção ao trabalho.
Parágrafo único – Os fiscais dos Institutos de Seguro Social e das entidades paraestatais em geral dependentes do Ministério do Trabalho, Industria e Comercio serão competentes para a fiscalização a que se refere o presente artigo, na forma das instruções que forem expedidas pelo Ministro do Trabalho, Industria e Comercio.

A relação de trabalho, entre a empresa e o trabalhador, pode ser fiscalizada pelo Ministério do Trabalho ou pelo Ministério da Previdência Social. No âmbito regional temos sua representação pela Delegacia Regional do Trabalho – DRT e Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS.

Esta atividade, por intermédio do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), é realizada por servidores integrantes da carreira de auditor-fiscal do trabalho, cuja atividade é regulada pela lei n.º 10.593/2002. Ao auditor-fiscal do trabalho incumbe assegurar a observância das disposições legais e regulamentares, inclusive às relacionadas à segurança e à medicina laboral, no âmbito das relações de trabalho. Pode lavrar autos de infração, inclusive com autuação indireta, bem assim termos de compromisso.

Enfim, os auditores-fiscais do trabalho cumprem uma função tanto de índole preventiva como repressiva e exercem função essencial à observância da ordem jurídica laboral, especialmente com a realização de ações fiscalizatórias.

Cumpre ressaltar que o auditor-fiscal do trabalho é um agente público. Referido termo é utilizado em sentido amplo, para englobar “o conjunto de pessoas que, a qualquer título, exercem uma função pública como prepostos do Estado.” O auditor-fiscal do trabalho enquadra-se como servidor público. Por efeito, seus atos têm presunções de veracidade e legitimidade, pela fé pública que lhe é conferida. Ainda, por conseqüência, os autos de infração e os relatórios de fiscalização, confeccionados alcançam as mesmas presunções.

De acordo com o art. 11 da Lei n. 10.593/02, os ocupantes do cargo de auditor-fiscal do trabalho têm por atribuições assegurar, em todo o território nacional o cumprimento de disposições legais e regulamentares, inclusive as relacionadas à segurança e à medicina do trabalho, no âmbito das relações de trabalho e de emprego; a verificação dos registros em Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, visando a redução dos índices de informalidade; a verificação do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, objetivando maximizar os índices de arrecadação; o cumprimento de acordos, convenções e contratos coletivos de trabalho celebrados entre empregados e empregadores; o respeito aos acordos, tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil seja signatário; a lavratura de auto de apreensão e guarda de documentos, materiais, livros e assemelhados, para verificação da existência de fraude e irregularidades, bem como o exame da contabilidade das empresas.

A referida lei ainda dispõe que o poder executivo regulamentará as atribuições privativas previstas no citado artigo, podendo atribuir aos ocupantes do cargo de auditor fiscal do trabalho outras funções, desde que compatíveis com atividades de auditoria e fiscalização.

Toda empresa, independente de sua atividade econômica, deverá manter à disposição do auditor fiscal o livro de inspeção do trabalho. Exceção dada às microempresas e empresas de pequeno porte (Lei 9.841/99 art. 11). É neste livro que o auditor lançará a documentação fiscal que a empresa deverá apresentar e o prazo. O referido livro deve ser adquirido em papelaria e mantido nas dependências do estabelecimento da empresa.

Entre outras documentações necessárias destacam-se: quadro de horário ou ficha/cartão de ponto devidamente aprovado; livros ou fichas de empregados preenchidos; folhas de pagamento; relação de empregados maiores e menores; relação de empregados homens e mulheres; acordo de compensação de horas; acordo de prorrogação de horas; encargos sociais: INSS, FGTS, IRRF e Sindical; rescisão contratual; recibo e aviso de férias; cópia de INSS protocolada no Sindical; normas regulamentadoras de saúde, higiene e segurança no trabalho: urbana até 29 normas e rural até 04 normas.

Para ocorrer a inspeção do trabalho numa empresa, não é obrigatório o pré-aviso, podendo o inspetor, dentro de sua região de competência, visitar o estabelecimento que achar necessário. O horário também não se dá de forma especial, podendo ocorrer em horário diurno ou noturno, e ainda, em qualquer dia da semana, sempre que o auditor fiscal achar necessário.

Instalada a inspeção no trabalho, a empresa deverá apresentar ao auditor fiscal, sendo solicitado por este, todas as suas dependências, sendo que o mesmo tem livre acesso a qualquer lugar dela. O auditor pode interpelar o dirigente ou preposto da empresa para que o mesmo faça os esclarecimentos necessários para o bom andamento da inspeção. Entendendo necessário auditor pode interrogar qualquer empregado, na presença ou não do empregador, visando apurar com perfeição os atos legais praticados.

O auditor fiscal pode retirar das dependências da empresa, mediante aviso ao empregador, cópias de documentos, modelos de equipamentos ou amostras de materiais para análise na sede da Delegacia Regional do Trabalho ou outro órgão a ela vinculado. É obrigatório manter a documentação fiscal no estabelecimento da empresa, podendo ser analisada no momento da inspeção ou com data e hora determinada pelo auditor fiscal. Não pode a empresa agir com procedimentos que impeçam o bom andamento da inspeção, a autuação pode, se caracterizada a má-fé, configurar-se com agravante.

O auditor fiscal do trabalho, quando da conclusão da inspeção in locu, se for o caso, lavra autos de infração e, muitas vezes, formula relatório de fiscalização. Estes documentos, conforme já exposto, além da relevância informativa, têm presunções de veracidade e legitimidade, por serem confeccionados e firmados por servidor público em exercício de sua atividade.

É facultado ao auditor fiscal requerer força policial para desempenhar o exercício de sua função, caso encontre resistência por parte dos representantes da empresa inspecionada. Ocorrendo necessidade de avaliação especializada, pode também o auditor requerer o acompanhamento de técnicos profissionais para apuração adequada dos dados em questão, como médicos do trabalho e engenheiros.

Quando forem verificados procedimentos irregulares na empresa que sejam sanáveis, é possível que o auditor fiscal, antes de aplicar eventual multa, conceda prazo para a correção por parte da empresa.

Verificando a gravidade do ato praticado ou reincidente, preencherá o auditor fiscal o auto de infração em duas vias, especificando os motivos e mencionando a fundamentação legal que justifica a autuação.

As multas são aplicáveis como base na Portaria 290/97 e anexos, a qual relaciona a natureza e a variação da multa em UFIRs, tendo graduação mínima e máxima. A multa é recolhida em formulário DARF no código fornecido pelo auditor fiscal. Não exime de outras penalidades, tais como penais ou cíveis, a multa aplicada.

Caso o empregador entenda que houve falha ou interpretação equivocada por parte do auditor-fiscal, a lei garante a elaboração de defesa à ser encaminhada para autoridade local competente. Normalmente representada pelo Delegado Regional do Trabalho. Faz-se necessário relatar os fatos, fundamentar a defesa e concluir o pedido, sendo relevante juntar documentos comprobatórios. Deverá, contudo, observar que o prazo prescreve em 10 (dez) dias para a defesa.

Caberá, ainda, recurso para o Diretor-Geral do Departamento do Ministério do Trabalho, das decisões da primeira instância (DRT), também no prazo de 10 (dez) dias após à notificação do indeferimento da defesa. Observa-se que nesse caso, o recurso deve ser acompanhado do recolhimento da multa, através de depósito junto ao Banco do Estado.

Cumpre observar, contudo, que as atuações do auditor fiscal do trabalho com relação a construção civil, principalmente no que tange as obras fiscalizadas, possuem limites, que precisam e devem ser respeitados.

No ramo da construção civil, as atuações que mais interferem as empresas e construtoras é a determinação de embargo ou interdição pela Superintendência Regional do Trabalho, através do auditor fiscal. Essa determinação pode ocorrer, através de laudo técnico, quando verificar-se existência de qualquer situação no ambiente de trabalho que possa representar grave e iminente risco para os trabalhadores, sendo grave e iminente risco, toda condição ambiental de trabalho que possa causar acidente do trabalho ou doença profissional com lesão grave à integridade física ou saúde do trabalhador.

O Ministério do Trabalho e Emprego disciplinou os procedimentos relativos aos embargos e interdições, previstos no artigo 160 a 162 da CLT e na Norma Regulamentadora nº 03, através da Portaria nº 40 de 14 de janeiro de 2011, publicada no DOU de 17/01/2011 e retificada no DOU de 18/01/2011.

A norma dita regras que promovem a relação de trabalho, impondo limites jurídicos para a atuação do auditor fiscal nos procedimentos relativos à paralisação total ou parcial da obra, de um estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento. A Portaria determina os procedimentos a serem seguidos para embargar ou interditar obras ou equipamentos, indicando na decisão as providências que deverão ser adotadas para sanar as irregularidades. Também determina os procedimentos que o empregador deve tomar para levantar o embargo ou a interdição, dando um prazo de um dia após a entrega da documentação para que nova inspeção seja realizada.

Quando constatado o descumprimento de embargo ou interdição, será lavrado auto de infração correspondente e haverá comunicação ao Ministério Público do Trabalho e à autoridade policial. Casos de reincidência na exposição dos trabalhadores a risco grave e iminente também serão comunicados ao Ministério Público do Trabalho. A imposição de embargo ou interdição não elimina a lavratura de autos de infração por descumprimento das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho ou dos dispositivos da legislação trabalhista relacionados à situação analisada.

É necessário ressaltar, contudo, que na atividade da Construção Civil, a atuação de alguns auditores fiscais muitas vezes extrapola as disposições de lei, prejudicando diretamente a empresa e indiretamente o trabalhador, pois após embargos ou interdições, mesmo a empresa enquadrando-se às exigências previstas no termo de autuação, o auditor fiscal demora demasiadamente para liberar a obra, o estabelecimento, o setor de serviço. Essa morosidade sempre foi umas das maiores preocupações do empreendedor.

Neste sentido, o artigo 3º da Portaria prevê que os auditores fiscais só poderão interditar estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento, ou embargar obra, se o Delegado Regional do Trabalho, hoje Superintendente Regional do Trabalho, lhe delegar essa competência, por Portaria específica, encaminhando-a à Secretaria de Inspeção do Trabalho, para ciência e adequação aos procedimentos previstos na Portaria. Recebida essa delegação, o Auditor Fiscal terá que respeitar diversos prazos, dentre eles:

I – O prazo de um dia útil após a lavratura do Termo de Embargo ou Interdição para encaminhar ao empregador a segunda via do referido termo juntamente com a segunda via do Relatório Técnico do local, obra, estabelecimento, máquina, setor, equipamento.

II – Quando o empregador solicitar o levantamento do embargo ou da interdição à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, o auditor fiscal deverá em, no máximo, um dia útil, a contar da data do protocolo de solicitação de levantamento, providenciar nova inspeção no estabelecimento, local da prestação de serviço, ou frente de trabalho para verificação se as medidas indicadas no Relatório Técnico foram exauridas pelo empregador.

Cumpre esclarecer que não se confundem os institutos do auto de infração e o do embargo e da interdição. O primeiro tem como um de seus principais requisitos a tipicidade da conduta do infrator, constante de ementário e com as infrações nele capituladas. O embargo e a interdição fundam-se em critérios técnicos, em virtude de constatação de situação de risco grave e iminente. O objetivo destes últimos é salvaguardar a vida e a integridade física do trabalhador.

Pode-se dizer que o auto de infração, além da tipicidade da conduta do infrator, constante de ementário e com as infrações nele capituladas, que consta, assim, de rol taxativo, exaustivo, fechado de infrações e tem como hipótese de incidência a efetiva perpetração de conduta irregular que viola preceito legal trabalhista, nos termos do art. 628 da CLT, tem por finalidade, ainda, registrar conduta infracional já consumada no tempo, podendo resultar em punição, por meio de multa, ao infrator. Há de se registrar, ainda, que, nos casos previstos no art. 23, do Regulamento da Inspeção do Trabalho, os auditores fiscais do trabalho têm o dever de orientar e advertir as pessoas sujeitas à inspeção do trabalho e os trabalhadores quanto ao cumprimento da legislação trabalhista, observando, para tanto, o critério da dupla visita.

De modo diverso, o embargo de obra e a interdição de estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento constam de rol exemplificativo, aberto, esparso pelas Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego, uma vez que é impossível às normas alcançarem todas as hipóteses de situações de grave e iminente risco à saúde e segurança do trabalhador.

Em muitos casos, a situação de risco grave e iminente existe no ementário sem que este a designe expressamente como tal. É o caso da execução de serviços pelo trabalhador em altura sem a utilização do cinto de segurança. Se a empresa não possuir o mencionado equipamento de proteção o trabalho deverá ser interrompido imediatamente até que a condição de segurança seja restabelecida.

Os institutos do embargo e da interdição referidos prescindem da necessidade de dupla visita, mesmo nos casos previstos no art. 23, do Regulamento da Inspeção do Trabalho, prescindem, ainda, de previsão em ementa específica, em virtude de ter seu fundamento de validade vinculado ao laudo técnico do serviço competente, nos termos do art. 161 da CLT, afastando-se, no caso, a idéia de tipo.

Registra-se, também, que o embargo e a interdição constituem-se em medida repressiva preventiva que tem os seus efeitos projetados para o futuro, a fim de evitar risco grave e iminente. Além de objetivar resguardar a vida e a integridade física do trabalhador e não punir a empresa, como seria o caso do auto de infração que pode ser convertido em multa, após o crivo do contraditório e da ampla defesa em procedimento administrativo.

Desta forma, não se configura dupla punição a aplicação simultânea dos instrumentos do auto de infração e do embargo e interdição, uma vez que, como demonstrado, tratam-se de institutos jurídicos com fundamentos, objetivos e desdobramentos práticos diversos. Neste sentido é a inteligência do art. 21 da Portaria MTE nº 40, de 14/01/2010, D.O.U 17.01.2011, que disciplina os procedimentos relativos aos embargos e interdições:

Art. 21 A imposição de embargo ou interdição não elide a lavratura de autos de infração por descumprimento das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho ou dos dispositivos da legislação trabalhista relacionados à situação analisada.

Desta forma, resta claro que o auto de infração e o embargo e interdição são institutos jurídicos afins, como manifestação do poder de polícia, mas que, na verdade, não se confundem, guardando cada um suas peculiaridades.

O embargo e a interdição são procedimentos fiscais especiais, na medida em que não correspondem a um processo que resulte, propriamente, em aplicação de multa pecuniária às empresas, mas que proporcionam uma conseqüência mais drástica, qual seja, a paralisação dos serviços em determinada máquina, equipamento, setor de serviço ou mesmo no estabelecimento inteiro.

Tratando-se de medida extrema, o embargo e a interdição devem ser adotados em último caso, ante a iminência do evento danoso ao trabalhador, devendo ser a única maneira necessária a evitar o risco presente no ambiente do trabalho.O embargo e a interdição devem satisfazer requisitos genéricos e específicos.

Genericamente, cuidando-se de medida exarada com base no poder de polícia do Estado, terá a medida tomada que satisfazer as seguintes regras:

– a da necessidade, em consonância com a qual a medida de polícia só deve ser adotada para evitar ameaças reais ou prováveis de perturbações ao interesse público;
– a da proporcionalidade, que significa a exigência de uma relação necessária entre a limitação ao direito individual e o prejuízo a ser evitado; e,
– a da eficácia, no sentido de que a medida deve ser adequada para impedir o dano ao interesse público.

De maneira específica, deverá a medida obedecer rigorosamente o estatuído no art. 161 da CLT e o que dispõe a Norma Regulamentadora nº 3 do MTE, e, que se resume em: elaboração de laudo técnico; situação de risco grave e iminente; e, decisão do Superintendente Regional do Trabalho e Emprego.

Em verdade, embargo e interdição são procedimentos fiscais passíveis de serem adotados pela fiscalização trabalhista, quando ficar constatada, em determinado ambiente de trabalho, a existência de uma ou mais situações de risco grave e iminente. Malgrado os dois mencionados procedimentos fiscais possam ser considerados sinônimos, em razão de propiciar a mesma conseqüência jurídica para a empresa, qual seja, a paralisação total ou parcial das atividades produtivas, o embargo corresponde à paralisação de máquinas, equipamentos, setor de serviço ou estabelecimentos nos quais são desenvolvidas atividades diversas das executadas em canteiros de obras.

Por estabelecimento deve ser entendida cada uma das unidades da empresa, funcionando em locais diferentes, tais como: fábrica, refinaria, usina, escritório, loja, oficina, depósito ou laboratório; canteiro de obra corresponde à área de trabalho fixa e temporária, onde se desenvolvem operações de apoio e execução à construção, à demolição ou a reparo de uma obra.

Oportuno enfatizar que a aplicação propriamente dita de sanções administrativas em face das empresas que descumprem a legislação trabalhista, inclusive as violações às normas jurídicas de proteção à saúde e integridade física dos trabalhadores, é ato da competência privativa do Superintendente Regional do Trabalho e Emprego. Compete ao auditor fiscal do trabalho, via de regra, dar início ao procedimento fiscal, seja com a lavratura do auto de infração, etapa primeira do processo de aplicação de multa administrativa, seja com lavratura do laudo técnico de embargo ou de interdição, fase inicial do processo de embargo ou interdição, pois, tanto numa hipótese quanto na outra, a decisão de aplicar ou não a sanção administrativa é do Superintendente Regional do Trabalho e Emprego.

Ao constatar, em determinado ambiente de trabalho, a existência de uma situação de risco grave e iminente, o auditor fiscal do trabalho lotado e em exercício na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, SRTE, procederá à lavratura do laudo técnico de embargo ou interdição e, em seguida, mediante protocolo na SRTE, solicitará ao Superintendente Regional do Trabalho e Emprego a concretização propriamente dita do embargo ou interdição, paralisando parcial ou totalmente as atividades de um estabelecimento ou canteiro de obras.

Contudo, conforme exposto, se o Superintendente Regional do Trabalho e Emprego, por meio de portaria específica, houver concedido poderes para tanto, poderá o auditor-fiscal do trabalho proceder à imediata paralisação dos serviços e em seguida submeter tal ato a posterior referendum do superintendente, o qual, obviamente, poderá manter ou suspender a medida adotada pela fiscalização.

A delegação de competência é, na atualidade, eficaz instrumento de desconcentração administrativa e, por isso, o Decreto-lei n.200, de 25.2.66, diz em seu art. 12 ser facultado ao Presidente da República, aos Ministros de Estado e, em geral, às autoridades da Administração Federal delegar competência para a prática de atos administrativos, conforme se dispuser em regulamento. Deve o ato de delegação indicar, com precisão, a autoridade delegante, a autoridade delegada e as atribuições objeto da delegação. Foi o preceito regulamentado pelo Decreto n. 62.460, de 25.3.68, que adverte, em seu art. 1º, que a delegação de competência terá por objetivo acelerar a decisão dos assuntos de interesse público.

O ato administrativo da delegação se funda no reconhecimento que, nesses casos, a demora na adoção de medida de efeito direto e imediato pode torná-la ineficaz para impedir a ocorrência do infortúnio, com graves conseqüências e danos irreparáveis aos trabalhadores.

Neste sentido é a prescrição do art. 3º da Portaria MTE nº 40, de 14/01/2010, D.O.U 17.01.2011, que disciplina os procedimentos relativos aos embargos e interdições:

Art. 3º Quando a competência prevista no caput do art. 161 da CLT e no seu §5º for delegada pelo Superintendente Regional do Trabalho e Emprego aos Auditores-Fiscais do Trabalho, com vistas a garantir a agilidade e efetividade da medida, deverá a portaria de delegação destinar-se a todos os Auditores-Fiscais do Trabalho em exercício na circunscrição da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, inclusive aos integrantes dos grupos móveis de fiscalização.

Esses mesmos auditores fiscais do trabalho estão, ainda, autorizados, com base no princípio do direito administrativo do paralelismo das formas, a levantar a interdição ou o embargo, desde que eliminadas por completo as condições de risco. Por certo que a todo levantamento de interdição e a todo desembargo, precederá sempre o relatório técnico correspondente, terminologia essa usada na mencionada Portaria MTE nº 40 para designar o laudo técnico do art.161 da CLT, obedecendo-se, assim, aos mesmos trâmites anteriores, É o que dispõe o parágrafo único, do art. 11 da Portaria MTE nº 40, de 14/01/2010, D.O.U 17.01.2011: “O relatório técnico servirá de base para a manutenção ou levantamento do embargo ou interdição pelo Superintendente Regional do Trabalho e Emprego ou pelo Auditor-Fiscal do Trabalho, no caso de competência delegada”.

É mister que para o embargo ou interdição elabore-se laudo técnico circunstanciado e fundamentado, que conclua existir na atividade empresarial examinada a potencialidade de risco grave e iminente. É o que está prescrito nos arts. 4º e 5º da Portaria MTE nº 40, de 14/01/2010, D.O.U 17.01.2011:

4º Quando o Auditor-Fiscal do Trabalho (AFT) constatar, em verificação física no local de trabalho, grave e iminente risco que justifique embargo ou interdição, deverá lavrar, com a urgência que o caso requer, Relatório Técnico em duas vias, que contenha: I – identificação do empregador […]; II – endereço do empregador […]; III – identificação precisa do objeto da interdição ou embargo; IV – descrição dos fatores de risco e identificação dos riscos a eles relacionados; V – indicação clara e objetiva das medidas de proteção da segurança e saúde no trabalho que deverão ser adotadas pelo empregador; VI – assinatura e identificação do AFT […]; e, VII – indicação da relação de documentos que devem ser apresentados pelo empregador quando houver a necessidade de comprovação das medidas de proteção por meio de relatório, projeto, cálculo, laudo ou outro documento.

5º o embargo e interdição deverão se fundamentar no Relatório Técnico, e ser formalizados por meio de Termo de Embargo ou Termo de Interdição, a partir dos modelos de conteúdo mínimo previstos nos Anexos I e II desta Portaria, com numeração seqüencial do órgão regional ou com numeração seqüencial precedida do número da CIF quando emitido por AFT.

O embargo e a interdição são atos administrativos, uma vez que assim são consideradas todas as manifestações unilaterais de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenham por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria.

Importante se registrar que o embargo e a interdição, como atos administrativos, constituem-se como emanação do Poder Público, e, como tal, trazem em si certos atributos que os distinguem dos atos jurídicos privados e lhes emprestam características próprias e condições peculiares de atuação. Esses atributos são a imperatividade, a auto-executoriedade e a presunção de legitimidade.

A presunção de legitimidade é qualidade inerente a todo ato da Administração Pública, qualquer que seja sua natureza. Este atributo deflui da própria natureza do ato administrativo, está presente desde o nascimento do ato e independente de norma que o preveja.

O fundamento da presunção de legitimidade dos atos administrativos é a necessidade que possui o Poder Público de exercer com agilidade suas atribuições, especialmente na defesa do interesse público. Esta agilidade inexistiria caso a administração dependesse de manifestação prévia do poder judiciário quanto à validade de seus atos toda vez que os proferisse.

Portanto, regra geral, o ato administrativo obriga os administrados por ele atingidos, ou produz efeitos que lhe são próprios, desde o momento de sua entrada no mundo jurídico, ainda que apontada a existência de vícios em sua formação que possam acarretar a futura invalidação do ato. Este requisito autoriza, portanto, a imediata execução de um ato administrativo, mesmo se eivado de vícios ou defeitos aparentes; enquanto não pronunciada sua nulidade ou sustados temporariamente seus efeitos, deverá ser cumprido. Enquanto não decretada a invalidade do ato pela Administração ou pelo Poder Judiciário o ato inválido produzirá normalmente seus efeitos, como se plenamente válido fosse, devendo ser fielmente cumprido.

Cabe lembrar, entretanto, que a presunção de legitimidade não impede que, desde que utilizados os meios corretos, possa o particular sustar os efeitos de um ato administrativo defeituoso. Existem remédios aptos a sustar a produção de efeitos dos atos administrativos reputados defeituosos, como recursos administrativos, quando possuem efeito suspensivo, liminares em mandados de segurança etc. É o que prescreve o art. 13 da Portaria MTE nº 40, de 14/01/2010, D.O.U 17.01.2011:

Art.13 Contra os atos relativos a embargo ou interdição, cabe a interposição de recurso administrativo à Coordenação-Geral de Recursos – CGR da Secretaria de Inspeção do Trabalho, que poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso, nos termos do § 3º do art. 161 da CLT.

Todavia, ainda que o ato administrativo venha a ter suspensa a produção de seus efeitos em face de determinados recursos, a presunção de legitimidade faz com que a obrigação de provar a existência de vício no ato seja de quem aponta esse vício.

Não é obrigação da Administração que proferiu o ato provar sua validade, pois já existe presunção nesse sentido. Aquele que afirma existir defeito no ato é quem possui o encargo de prová-lo.

Essa presunção, porém, não é absoluta, pois admite prova em contrário. Assim, por se tratar de presunção relativa tem como real conseqüência a transferência do ônus da prova para quem invoca a ilegitimidade do ato.

Não resta dúvida, portanto, que a vida do trabalhador prevalece sobre qualquer interesse material ou econômico da empresa. Frise-se que a regulamentação do art. 161 da CLT, com a publicação da Portaria MTE nº 40, de 14/01/2010, D.O.U 17.01.2011, visa estabelecer regras de ação das autoridades competentes com o fito de equacionar harmonicamente os interesses do trabalhador, da empresa e da sociedade.

Contudo, independentemente da autonomia que lhe dá a legislação, fica claro que o auditor fiscal no exercício de suas atribuições e competências deve respeitar a Portaria nº 40/2011.

Neste sentido, cabe aos Gerentes e Supervisores de obra das empresas, receberem o auditor fiscal do trabalho com respeito, buscando, através do diálogo, a colaboração e orientação dele para o atendimento das exigências legais quanto ao procedimento de embargo e interdição, e, caso haja afronta a Portaria nº 40/2011, a empresa poderá recorrer à Coordenação-Geral de Recursos da Secretaria de Inspeção do Trabalho. Fonte: