201803.27
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Entidades patronais perdem cerca de 80% do imposto sindical

A reforma trabalhista começa a descortinar efeitos dramáticos para as finanças de entidades sindicais, profundamente
afetadas pelo fim da obrigatoriedade do pagamento do imposto sindical. As organizações patronais são as primeiras a
amargar perdas. Números atuais da arrecadação da contribuição mostram que elas tiveram redução de cerca de 80% em
2018 na comparação com o ano passado, considerando as maiores confederações e federações setoriais, além das 20
entidades empresariais que mais arrecadam.

Essas organizações patronais em todo o país recolheram mais de R$ 300 milhões em janeiro de 2018. Em todo o ano
passado, o valor global arrecadado somou R$ 1,4 bilhão, o que indica que o buraco no caixa das entidades pode chegar a R$
1,1 bilhão se os recursos não entrarem ao longo do ano

Embora a informação disponibilizada pelo Ministério do Trabalho via Lei de Acesso à Informação (LAI) traga períodos
distintos para cotejamento, a diferença de R$ 1,1 bilhão representa a perda potencial que as entidades devem sentir em
seus orçamentos neste ano. Isso porque o imposto sindical é recolhido em 31 de janeiro. Depois disso, eventuais entradas
no caixa são consideradas residuais. Já o recolhimento-base das entidades de trabalhadores é 31 de março.

O derretimento é geral. Pequenos sindicatos e grandes confederações são atingidos pelas novas regras introduzidas pela
reforma trabalhista. Chama atenção o enfraquecimento das receitas das federações estaduais de comércio e das indústrias,
que são as maiores potências arrecadadoras entre as entidades patronais.

No fechamento de janeiro deste ano, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) contabilizou só R$ 2,3
milhões de entrada do imposto sindical contra uma arrecadação de R$ 16,9 milhões ao longo de todo ano de 2017, uma
queda de mais de 85%. Paulo Skaf, presidente da Fiesp, esperava zero e se surpreendeu com o valor.

“O que entrou foi completamente voluntário, não pedimos. Também não contamos com compensação do Sistema S.
Fizemos um ajuste, reduzindo custos, para cobrir os 15% que o imposto sindical representava no orçamento”, explica Skaf.
Ele admite que isso incluiu renegociação de contratos, junção de departamentos e cortes.

A redução da arrecadação do imposto sindical e de outras receitas da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro
(Firjan) começou com a recessão econômica de 2014 e 2015. Desde então a entidade vem “reorientando suas despesas”,
conta o vice-presidente-executivo Ricardo Maia.

“Não estamos fazendo cortes agora. Ajustes de custos e estrutura já ocorreram nos últimos três anos em todo o Sistema Firjan, decorrentes da redução doemprego no Rio e em consequência da queda na arrecadação da contribuiçãocompulsória sobre folha, nossa outra fonte de receita. Nossa estrutura deatendimento foi reduzida em 30%”, completa ele.

A queda de arrecadação da Firjan do imposto sindical em 31 de janeiro de 2018 na comparação com o ano passado foi de 82,5%, para R$ 1,2 milhão. O dirigente da federação acrescenta que o reforço dessa receita será residual aolongo do ano. “Se ocorrer, não será nada acima de R$ 100 mil de fevereiro a dezembro”, diz Maia.

A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP) admite que sua
responsabilidade de representar 1,8 milhão de estabelecimentos comerciais e de serviços paulistas “sofrerá” com a queda
de 79,1% da arrecadação do imposto sindical em apenas um ano, de R$ 29,3 milhões em 2017 para R$ 6,1 milhões em 31 de
janeiro.

“Estamos revendo planejamento orçamentário para cumprir nossa função com as receitas existentes. Cortes, como de
funcionários, redução de representações e trabalhos institucionais, já foram observados e poderão ocorrer para haver o
devido ajuste à atual realidade. Entretanto, outras receitas de serviços a serem implementados serão revertidas em favor da
[atividade de] representação”, informa Ivo Dall’Acqua Junior, vice-presidente da Fecomercio-SP.

O dirigente sindical lembra que há dezenas de ações protocoladas no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando o fim
da obrigatoriedade de pagamento do imposto sindical por parte de trabalhadores e empresas. “A Fecomercio-SP não entrou no Judiciário contra a reforma trabalhista, mas acompanha as ações que estão tramitando. Também é importante destacar que ainda existe a facultatividade do recolhimento. A tendência de queda se manterá, mas podemos ter ligeira elevação [em relação à maior parte da arrecadação registrada em 31 de janeiro] fundada na consciência do empresariado da necessidade de manutenção do sistema sindical de representação”, acrescenta Dall’Acqua Junior.

Por meio de nota oficial, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) defendeu uma fonte de
receita alternativa, mas não detalhou o assunto. “Esperamos que sejam criadas alternativas para substituir a contribuição
sindical, preservando as atividades de representação dos sindicatos empresariais.”

Já José Romeu Ferraz Neto, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusconSP),
descarta qualquer possibilidade de reativação de qualquer tipo de taxa similar ao imposto sindical. “De jeito nenhum,
fomos uma das primeiras entidades a defender o fim da contribuição obrigatória. Se sindicato é bom e produz resultado, as
empresas vão querer ficar nele. Isso [o fim da obrigatoriedade de recolhimento do imposto sindical] é bom para acabar
com os sindicatos que não representam nada, que são só burocráticos, do lado empresarial e dos trabalhadores.”

Na passagem de 2017 para 2018, a perda de arrecadação do Sinduscon-SP foi de 91%, passando de R$ 7,6 milhões para
pouco mais de R$ 600 mil. Ainda no ano passado, antes mesmo de a reforma trabalhista entrar em vigor, a entidade se
reestruturou. Cortou metade dos funcionários da sede e de subsedes, terceirizou departamentos administrativos e está
apostando na transformação de empresas filiadas em associadas, que pagam uma mensalidade ao sindicato.

“Temos espaço grande para crescer e ampliar nossas receitas, apesar das perdas. Temos 12 mil empresas filiadas. Desse
total, nos últimos meses, já conseguimos convencer 1,2 mil a se associarem”, complementa Ferraz Neto.

Fonte: Valor Econômico