201510.26
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A legislação do imposto de renda não limita as retiradas dos sócios

Ainda me deparo, uma vez ou outra, com contratos sociais que estipulam a possibilidade de retiradas dos sócios “até o limite máximo determinado pela legislação do imposto de renda”.

Mas há realmente alguma lei tributária que restrinja o poder dos sócios de fixarem as suas remunerações (pro labore)?

Desde logo, assevera-se que seria inconstitucional, por afronta direta ao princípio constitucional da livre iniciativa (princípio fundamental da República Federativa do Brasil e base da atividade econômica brasileira) qualquer lei que limitasse o direito dos sócios de fixarem as suas próprias remunerações.

E não há na ordem constitucional vigente – nem havia sob o manto de Constituições anteriores – nenhuma regra que estabeleça limites para as retiradas dos sócios.

Havia – e não há mais – norma tributária que prescrevia tratamento fiscal mais gravoso para retiradas (pro labore) de sócios que excedessem alguns limites.

Deveras, na vigência do Decreto-lei n. 5.844/1943, as remunerações dos “negociantes em firma individual ou sócios de sociedades comerciais e industriais” somente eram deduzidas da base de cálculo do imposto de renda da pessoa jurídica se não excedessem “Cr$ 24.000,00 anuais, quando o capital do beneficiado não fôr superior a Cr$ 120.000,00”; “ultrapassando o capital essa quantia”, a remuneração poderia atingir “a 20% dêle, até o limite máximo de Cr$ 120.000,00 anuais”.

Depois, com o advento da Lei n. 4.506/1964, a legislação tributária passou a elencar novos limites dos valores de retiradas dos sócios, também para efeito de dedutibilidade de tais despesas do lucro real da empresa.

Verifica-se, destarte, que, mesmo na vigência dos referidos diplomas legais, a lei do imposto de renda não limitava os valores de pro labore dos sócios-gerentes (atualmente denominados sócios administradores); tão somente impunha um regime tributário mais oneroso para as suas retiradas que superassem os limites fixados pela norma tributária.

A partir de 1° de janeiro de 1997, com a vigência da Lei n. 9.430/1996, a legislação tributária deixou de estipular qualquer limite para as retiradas dos sócios, o que reforça ainda mais a impertinência de cláusula de contrato social que condicione as retiradas dos sócios ao “limite máximo determinado pela legislação do imposto de renda”.

De qualquer modo, ainda que as regras tributárias limitativas dos valores das remunerações dos sócios (para efeito de dedutibilidade de tais despesas do lucro real da empresa) fossem atualmente válidas, seriam ineficazes para a maioria das pessoas jurídicas que não apuram o imposto de renda pela sistemática do lucro real e para quem, consequentemente, é irrelevante a dedutibilidade, como despesa, das remunerações dos sócios (ex.: pessoas jurídicas que adotam a sistemática do lucro presumido e microempresas e empresas de pequeno porte aderentes do Simples Nacional).

Portanto, em prestígio da livre iniciativa, os integrantes de uma sociedade podem fixar a remunerações dos sócios que trabalham para a sociedade sem nenhuma limitação legal, admitindo-se, no ordenamento jurídico atual, que os valores das respectivas retiradas sejam integralmente deduzidas do lucro real da pessoa jurídica.

Ressalte-se apenas que, embora não submetida a nenhum “limite máximo determinado pela legislação do imposto de renda”, a remuneração do sócio é rendimento tributável da pessoa física, submetido à tributação do IRPF de acordo com a tabela progressiva, além de integrar a base de cálculo das contribuições previdenciárias, tanto aquela devida pelo trabalhador (sócio) como a contribuição devida pela empresa.